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Oceanos e Rios

A importância do Aquífero Guarani

O geólogo Didier Gastmans fala sobre a exploração excessiva dessa importante reserva hídrica
Bruno Torres
27/09/19

Algumas cidades do interior de São Paulo, entre elas, Ribeirão Preto (313 km), São José do Rio Preto (438 km) e Bauru (342 km), vivem um momento preocupante em relação à água, no qual a utilização excessiva do Sistema Aquífero Guarani (SAG) pode tornar o uso do manancial inviável para o abastecimento desses municípios dentro de alguns anos. A principal consequência da exploração predatória é o rebaixamento do nível de água do lençol freático. Em entrevista exclusiva ao Portal NAMU, o pesquisador do Laboratório de Estudos de Bacias da UNESP Rio Claro, Didier Gastmans, explica o problema e as medidas necessárias para proteger essa reserva hídrica.

Portal NAMU: Quais os motivos que levam ao rebaixamento do nível de água do Aquífero Guarani em algumas cidades? O senhor pode explicar como ele se dá?
As águas subterrâneas são armazenadas nos aquíferos em duas situações: aquífero livre e aquífero confinado. De maneira resumida, podemos dizer que no primeiro caso a água subterrânea está conectada diretamente com a atmosfera e os rios, recebendo recarga da água da chuva. No segundo, camadas impermeáveis confinam a água subterrânea armazenada nos aquíferos que deixam de receber recarga e passam a ser armazenadas sob pressão dentro do manancial com um nível de água muito acima do topo do aquífero.

O Sistema Aquífero Guarani apresenta-se confinado por rochas impermeáveis (basaltos) em quase a totalidade de sua área de ocorrência. Os níveis de água, por sua vez, ficam muito acima do topo do aquífero, o que faz com que o volume de água armazenado nessa porção acima do aquífero seja muito pequeno, pois ela representa a pressão de confinamento. Com o bombeamento para a retirada de água, ocorre uma rápida perda de pressão, o que leva a rebaixamentos muito grandes nessas condições. Essa questão é potencializada pela existência de um número muito grande de poços que retiram grandes quantidades de água do aquífero em taxas muito maiores que as que são repostas naturalmente.

A exploração dessas águas possui um caráter de mineração de águas, que possivelmente não será reposta no tempo de planejamento humano.

O grupo de pesquisas ao qual pertenço, em conjunto com o professor Chang Hung Kiang, também da UNESP de Rio Claro, vem realizando pesquisas com a utilização de um isótopo radioativo chamado criptônio 81 (Kr 81) juntamente com a Agência Internacional de Energia Atômica. Eles concluíram que o tempo gasto para que a água no SAG leva para ir da área de recarga até a cidade de São José do Rio Preto é de cerca de 400.000 anos, ou seja, a água que está sendo extraída hoje, penetrou no SAG há quase 500 mil anos atrás. Portanto, a exploração dessas águas possui um caráter de mineração de águas, que possivelmente não será reposta no tempo de planejamento humano.

Ciclo hidrológico
Esquema básico de funcionamento do ciclo da água na natureza

Em algumas cidades do interior o aquífero não chegou a ser afetado com a seca de 2014. Em Araraquara, por exemplo, segundo informações do DAEE, somente a coleta de água superficial foi prejudicada. Como a seca pode afetar as águas subterrâneas?
Os efeitos de estações secas são sentidos nas regiões em que os aquíferos são livres, pois a falta de chuva diminui a infiltração de água nos aquíferos. Em um trabalho de mestrado que estou orientando em Ararquara sobre o monitoramento dos níveis de água e sua variação temporal, percebemos alguns rebaixamentos em taxas um pouco menores que as observadas em Ribeirão Preto.

De acordo com o Atlas de Abastecimento de Água elaborado pela Agência Nacional de Água (ANA) em 2011, caso os municípios da Região Metropolitana de São Paulo não tomassem providências até 2015, não haveria água suficiente até 2025. Quais são as consequências para o Aquífero Guarani e para a população caso a exploração continue em ritmo acelerado?
Não conheço em profundidade o Atlas de Abastecimento da ANA, mas a busca constante por soluções de abastecimento é uma necessidade em função do aumento das demandas, seja para o abastecimento público ou industrial nas áreas urbanas, seja para a utilização em áreas rurais. Entendo que a política que vem sendo realizada, de se buscarem novos mananciais, está esgotada. A gestão moderna dos recursos hídricos deve passar por uma maior eficiência no aproveitamento dos mananciais captados atualmente, como a diminuição de perdas físicas, redução do consumo residencial e industrial por meio de equipamentos mais eficientes (torneiras, descargas, trocadores de calor etc) e uma participação maior no balanço hídrico de águas de reúso, que podem ser utilizadas em diversas atividades em que a qualidade não é fator preponderante.

Aquífero
Modelo esquemático dos tipos de aquíferos e meios de recarga 

Com base na seca que atingiu o Sistema Cantareira em 2014, a USP elaborou um projeto que avalia a possibilidade de captar água do Aquífero Guarani na cidade de Itirapina. O aquífero é capaz de comportar tamanha demanda, considerando que em alguns pontos do estado ela já é bem maior do que a oferta?
Inicialmente deve ser feito um esclarecimento a respeito desse estudo. Ele foi idealizado em 2002 pelo grupo do professor Chang Hung Kiang da UNESP atendendo uma solicitação do geólogo José Carlos Shimanke Souza, na época presidente da Associação Brasileira de Águas Subterrâneas (ABAS) e diretor do setor de águas subterrâneas da Sabesp. O que o grupo de pesquisadores da USP fez foi se apropriar de uma ideia já pronta. No projeto inicial, a proposta era abastecer a região de Campinas e Piracicaba, entre outros municípios localizados na Bacia do Piracicaba-Capivari-Jundiaí (PCJ), visando aumentar a disponibilidade hídrica do Sistema Cantareira. O projeto nunca foi levado adiante, mas um dos grandes atrativos da proposta era o baixo consumo energético, uma vez que as áreas de afloramento do SAG encontram-se mais elevadas do que a Bacia do PCJ.


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