Em tempos em que podemos encontrar sem muito esforço a informação que buscamos na internet, faz-se necessário reinventar a educação formal. O arriscado diálogo entre novas tecnologias, educadores e alunos cria um momento de transição em que predominam dúvidas. Como beneficiar o aprendizado com o uso de tecnologia foi tema de um dos debates do Ciclo de Encontros com a Educação promovido pela Sociedade Antroposófica no Brasil.
"Tecnologia é um meio, uma metodologia para ajudar a fazer tarefas usando menos tempo e energia”, acredita Camila Haddad, idealizadora da Cinese, uma plataforma de aprendizado colaborativo por meio da qual pessoas com interesses em comum se conectam e trocam informações. “A partir do virtual é estabelecido um elo entre quem quer aprender e quem deseja ensinar", acredita ela, uma das convidadas para o encontro.
Os novos dispositivos permitem que se quebre o paradigma antigo de repetir modelos que padronizam e não respeitam o indivíduo e suas necessidades. No debate, foi visto como vantagem a possibilidade de ampliar o aprendizado personalizado. É possível identificar temas de interesse dos alunos, a partir dos quais o professor transmite o conhecimento específico.
“O processo é semelhante ao que se faz na educação infantil: usam-se dinossauros para falar de pré-história”, diz Patrícia Gomes, jornalista da agência de notícias sobre inovações em educação, Porvir. Dividir chocolates para ensinar frações parte do mesmo pressuposto, mas hoje o universo das crianças está muito mais amplo. E a identificação dos interesses pode partir de uma tecnologia como a Big Data – sistema que observa os acessos e citações do usuário de tecnologia e identifica gostos.
Outro ponto de destaque foi a preocupação de como fica o papel do professor com a entrada de dispositivos atrativos no ensino. O pedagogo Peter Biekarck questionou “Quando a tecnologia entra em sala de aula, o que sai? Como fica a relação com o professor?”. As perguntas estendem-se aos hábitos da família. Quando uma criança passa horas e horas em frente a uma tela, isso ocorre por falhas no relacionamento familiar?"
Para Thiago Feijão, engenheiro idealizador do QMágico, que desenvolve ferramentas educativas, “a tecnologia é adaptativa: pode transmitir boa parte da informação enquanto o professor se prepara para gerar a curiosidade”. Além das plataformas adaptativas e dos aplicativos, até games estão sendo empregados nesse sentido.
Também foi apontada a necessidade de respeitar a diferença de idades no processo de inserção da tecnologia no ensino – a pré-escola precisa muito menos dessas ferramentas do que o fundamental. Já o ensino médio cada vez depende mais dessas inovações.
O pedagogo Peter Biekarck alertou sobre alguns riscos dessa mudança no sistema educacional. Pesquisas e estudos indicam que tantas fontes de atração acabam por dificultar o foco dirigido e prejudicam a concentração. A “evolução tecnológica desapodera nossos membros e leva à letargia do sistema orgânico muscular”, explica Biekarck. Ele também apontou que o excesso de inteligência para a vida virtual está levando ao total despreparo para o real. “Os jovens estão sendo anestesiados com mídias virtuais para que sejam evitados conflitos reais”, afirma.
Durante a discussão, foram lembradas as pesquisas do educador e antropólogo Sebastião Rocha, envolvido com tecnologias da educação. Ele pontua que o ideal é haver um entrosamento entre o TIC e o TAC. TIC é a sigla para Tecnologia de Informação e Comunicação. O TAC é o que ele chamou de tecnologia da aprendizagem e convivência. No caso da educação formal, o equilíbrio é o aprendizado híbrido – as facilidades processuais somadas à sabedoria e ao método do educador. “A tecnologia é um meio de se chegar a um fim”, coloca Patrícia Gomes.
Foi citada no evento a história de uma mãe que se alegrou quando a escola entregou um iPad para sua filha de 16 anos, no ato da matrícula. “Nossa escola é antenada com as tecnologias", anunciou a diretora dessa escola. A afirmação foi por terra no primeiro dia de aula. “Mãe, que coisa chata: a professora escrevia na lousa e a gente copiava no iPad”, reclamou a menina. "Que diferença isso tem em relação a copiar no caderno? Se nenhuma, isso não é inovação, mas repetição", argumenta Alves. "Será inovação se o processo depender da tecnologia para ser viabilizado".
Tecnologias empregadas na educação necessariamente devem aproveitar o virtual para sistematizar novas formas de aprendizagem. Viviane Alves cita alguns exemplos:
A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo. Nelson Mandela
Um formato bastante utilizado nos Estados Unidos é o fliped classroom, em que um tema é apresentado por recursos eletrônicos e depois explorado em sala de aula pelo professor e pelos alunos. A vantagem é que o aluno chega à aula sabendo algo a respeito do assunto, o que facilita o aprofundamento do aprendizado. “No Brasil, estas formas de ação ainda são bastante incipientes, mas estamos caminhando”, afirma Alves.
Fotos: Roberta Akan
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