Redes sociais sempre existiram. Bem antes de 1969, quando nasce a Internet, sociólogos e psicólogos sociais, entre outros, produziam estudos sobre por que os humanos se reuniam em volta da fogueira para postar oralmente os últimos acontecimentos da tribo e escutar as frases dos caciques e pajés. O Facebook e o Twitter são a versão eletrônica de um comportamento iniciado quando o homem começa a desenvolver a linguagem.
Nos anos 1930, os afetos em rede já eram estudados pelo médico, psicólogo e filósofo romeno Jacob Levy Moreno, criador do sociograma, “representação gráfica da estrutura de relações interpessoais entre os membros individuais de um grupo”.
1 Servia inclusive para medir as probabilidades de relacionamento amoroso dentro de um grupo.
Moreno, o inventor do psicodrama, é considerado um teórico complementar a Jung.
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A fantasia e os arquétipos
Para Jung, chegamos ao mundo já munidos de “protoformas”, ou seja, representações básicas, arquétipos, o que inclui o feminino, o masculino, pai, mãe. São formas que se repetem em várias culturas diferentes, sem que uma tenha tido contato com a outra.
As redes sociais eletrônicas são ambientes propícios às manifestações arquetípicas. Quando alguém se apresenta na rede, é com suas próprias representações acerca dos outros internautas que dá a conversa, ou seja, com suas heranças inconscientes. À falta da pessoa real, os arquétipos nos ajudam a imaginar o outro e o que deve ser dito para agradar.
Idade influencia a forma de interagir
Outro fator bastante influente nos relacionamentos virtuais é a idade. Jovens usam as redes sociais como extensão do mundo offline, diferentemente dos mais velhos. Nos EUA, onde há pesquisas sólidas a respeito, há 80 milhões de solteiros acima dos 50 anos. É o grupo que mais usa a internet para fins amorosos. Usam a rede como quebra gelo e propulsora para encontros pessoais.
O mercado de encontros e relacionamentos virtuais é tão amplo que há gente que vive de assessorar pretendentes online a criarem perfis atraentes nas redes sociais, o que inclui redação do perfil. São chamados de “online dating assistants”, assistentes de namoro virtual. Em outros termos, o que estes profissionais fazem é moldar o perfil online de alguém às expectativas dos outros internautas, pegam o real e transformam em uma fantasia que combine com os arquétipos alheios. São criadores de personas, como autores de teatro.
Problemas e questões
Entre as críticas aos relacionamentos online, chamá-los de vazios é uma das mais comuns. A sensação de falta é constitutiva da subjetividade humana, e absolutamente saudável. Relacionar-se apenas online, no entanto, substitui os altos e baixos da realidade e o indivíduo pela fantasia. A pessoa lida com mitos, não com indivíduos.
Jung, por sinal, chamou de individuação o processo de amadurecimento, a evolução da consciência em direção ao um si mesmo diferente do todo. Deste ponto vista, priorizar só os relacionamentos online afasta o sujeito de sua essência diferenciada do todo, deixando-o preso a padrões coletivos. A atividade vital do indivíduo, ainda segundo Jung, é prejudicada quando este se afasta do processo de individuação.
De fato, quem estuda os usuários compulsivos da rede sabe que não é internet o problema, mas sim questões psicológicas como timidez, baixa autoestima, depressão ou doenças e manias. Não interagir pessoalmente aumenta a probabilidade destes complexos prejudiciais. Estar com o outro é uma forma de conscientização, de ouvir algo que não seja os próprios sintomas.
Mentiras
O anonimato da internet favorece a mentira. A mais comum delas é o peso, sempre para baixo. Agradar o coletivo exige medidas certas e afastamento da individuação em nome de personas específicas. Fotografias desatualizadas, idade, renda e estado civil (no caso de homens) seguem como informações menos confiáveis nos perfis online.
Há, porém, mentiras perigosas. A disponibilidade de informações sobre suas potenciais vítimas favorece a ação de criminosos e sociopatas, gente cujo único interesse é se aproveitar das fragilidades alheias, da sensação de vazio, inclusive. Ter informações detalhadas só lhes facilita o trabalho.
Crianças na rede
Para quem nasceu nos últimos dez anos, redes sociais são o comum, tal como ir à escola. Os pais se alarmam e a televisão sempre mostra casos de aliciamentos online. Não há pesquisas que sustentem que a quantidade de abusos infantis iniciados online seja maior que o offline. O perigo continua sendo pessoas próximas fisicamente, como parentes e vizinhos.
As redes sociais, por outro lado, beneficiam a sociabilidade das crianças. Seus colegas online costumam ser os mesmos da escola, primos e familiares. A rede vira extensão. A vigilância dos pais pode diminuir uma maior exposição.
Seres sociais
Por fim, como bem observa o especialista em comportamento das redes sociais Jonah Berger, autor de
Contagius: Why Things Catch On (Contágio: porque as coisas pegam): “Conectar-se com os outros é gratificante, faz-nos sentir como nós não estamos sozinhos no mundo. As pessoas gostam de dizer às outras pessoas sobre si mesmas. Pesquisas mostram que falar de nós mesmos é gratificante; compartilhar pode ser gratificante para o cérebro."
Não estar sozinho no mundo e ser você mesmo são os fatores que Jung considerou importantes para o amadurecimento. Redes sociais online são apenas ferramentas de manifestações dos arquétipos profundamente humanos.
Foto: Dangubic / Thinkstock
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