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Gerais

A cultura colaborativa invade a cidade

Festival CoCidade reúne projetos financiados coletivamente, intervenções e iniciativas colaborativas em São Paulo
Bruno Torres
28/01/15

Uma cidade acolhedora, alegre, colorida, cheia de artistas de rua, barracas de comida e música. Essa descrição ainda está distante do que vemos caminhando pelas ruas de São Paulo, mas é para ela que apontam as discussões geradas durante o festival CoCidade, produzido por diversos coletivos e realizado entre os dias 8 e 18 de setembro. O festival teve seu ponto alto em um evento realizado no dia 13, na Praça das Artes, no centro da cidade, que contou com a participação do prefeito Fernando Haddad na mesa de abertura e apresentou ao público dezenas plataformas e projetos viabilizados por meio do financiamento coletivo.

“Eu acho que esse momento foi histórico para a cidade de São Paulo. Isso que está acontecendo, essa mudança na lógica de como o poder público gere a cidade, e essa mudança na lógica do que é ser cidadão nessa cidade, está explodindo”, define a jornalista Natália Garcia, que participou do debate principal e é uma das idealizadoras do projeto Cidades Para Pessoas.

Debatedores do festival cocidade
Da esquerda para a direita: Oswaldo Oliveira, Natália Garcia, Juca Ferreira, Fernando Haddad, Thiago Vinícius, Luís Otávio Ribeiro e Georgia Nicolau.

O CoCidade emergiu de três pilares: o financiamento coletivo, os espaços colaborativos e a ocupação urbana. “Nós vimos a necessidade de um lugar físico – e não só virtual – para mostrar tudo isso que está acontecendo no Brasil e no mundo. Então, unimos alguns projetos e plataformas que são AHH!, Efêmero Concreto, Agência Popular Solano Trindade e o Catarse. Esse foi o principal grupo”, conta Deco Benedykt, um dos organizadores.

Uma exposição foi organizada para apresentar ao público algumas das principais plataformas e projetos que trabalham com o modelo que ganhou notoriedade como crowdfunding. Esse tipo de financiamento funciona com apoio de pessoas que contribuem com pequenas (ou não) quantias de dinheiro para viabilizar determinado projeto ou produto. Criado em 2011, o Catarse é a principal referência no Brasil, tendo viabilizado mais de 1.200 projetos, com mais de R$ 20 milhões arrecadados. "Esse evento concretiza muita coisa que a gente construiu ao longo dos anos. Eu acho que é importante ter a percepção de que se pode usar a tecnologia para poder se aproximar e viabilizar coisas que não ficam restritas ao virtual, vêm para o olho no olho", afirma Luís Otávio Ribeiro, sócio da empresa.

Barraca apresentando trabalho do carlotas

Dezenas de projetos financiados coletivamente tiveram espaço para divulgar seus trabalhos no festival

Em um balcão, representantes de espaços colaborativos fizeram um plantão para esclarecer dúvidas dos visitantes. “A Laboriosa 89 é conhecida como um espaço colaborativo, mas é um espaço muito esquisito, do ponto de vista do que a gente entende por administração de espaços. Porque a chave fica na porta, e para você usar a casa você não precisa de nenhum tipo de cadastro, associação, não tem nenhum tipo de curadoria”, explica Oswaldo Oliveira, um dos idealizadores do projeto que recebe o mesmo nome de seu endereço, a rua Laboriosa, 89, na Vila Madalena. Segundo ele, trata-se de um ambiente absolutamente diverso e sem qualquer tipo de hierarquia. Sem um gestor ou uma autoridade de plantão, a regra é: resolvam-se entre vocês.

“Você é obrigado a aprender a divergir amorosamente. Isso acaba se transformando em uma escola pra você aprender a lidar com esse mundo novo, que é um mundo mais colaborativo, mais diverso, inclusivo e abundante. E acho que é isso que a gente quer para a cidade. Nós buscamos a capacidade de colaborar e conviver com o diferente de forma amorosa”, acredita Oliveira.

Papel do Estado

Se há até pouco tempo, o poder público simbolizava um dos grandes impedimentos para que esse tipo de espírito se instalasse na cidade, o momento atual parece indicar que caminhamos para dias melhores. Durante a mesa de abertura, o prefeito Fernando Haddad criticou o processo de privatização ocorrido durante os últimos 40 anos, em que, segundo ele, a população foi se afastando das ruas e dos espaços públicos com medo de conviver na cidade.

“E ao invés de tentar reverter esse processo, o poder público só fez piorar as coisas, com uma série de medidas proibitivas que reforçaram o sentimento de que nós não deveríamos viver a cidade”, afirmou, se referindo desde a escolha dos subprefeitos, que recaiu sobre militares durante muitos anos, até outras como a proibição da comida e dos artistas de rua na cidade de São Paulo.

Para Haddad, é necessário aumentar a presença do Estado na vida das pessoas, “a produção cultural foi privatizada nos anos 90, também não podemos nos esquecer disso. Quem financiava a cultura no final dos anos 90 era o mercado, e apenas o mercado, por meio das leis de incentivo. Na década passada, entramos num outro cenário, qualitativamente superior, que foi o fomento público a arte, ou seja, os orçamentos públicos começaram a receber quantias mais expressivas, e escapar da lógica do mercado, das agências de marketing, financiarem e decidirem o que é cultura ou não. E eu estou vendo que nessa década, nós estamos entrando em um novo ciclo, e talvez até mais virtuoso, que é o financiamento comunitário da produção artística, da produção cultural e da inovação".

Fachada do prédio da praça das artes

A Praça das Artes é um premiado projeto arquitetônico no centro da cidade, destinado a receber eventos culturais

“Nóis é ponte e atravessa qualquer rio”

Thiago Vinícius é um dos idealizadores da Agência Popular Solano Trindade, empreendimento construído por jovens que tem como proposta fomentar e fortalecer a economia da cultura criativa por meio do incentivo da produção e difusão da cultura popular. “Eu fico muito feliz de ver que a minha quebrada é um coworking. A minha quebrada é um grande escritório coletivo. O terreiro é um escritório coletivo, a aldeia é um escritório coletivo”, declarou, deixando claro que, para ele, o movimento colaborativo não é exatamente uma novidade.

Seguindo a mesma linha de pensamento, Georgia Nicolau, da Secretaria da Economia Criativa do Ministério da Cultura, acredita que a linguagem e as nomenclaturas que permeiam o tema da colaboração precisam ser revistas. “Coworking, crowdfunding, startup, rodada de negócios. Para quem esses termos se comunicam? E para que? Se a gente quer propor novas formas de fazer, de produzir, de se sustentar, alternativas reais ao capitalismo, creio que precisamos também reinventar simbolicamente e resgatar historicamente outros significados para essas ferramentas”, alerta ela.

Cidades Para Pessoas

Natália Garcia coordenou a oficina Cidades Para Pessoas, que abriu o festival na Escola São Paulo. Esse trabalho reuniu mais de 20 pessoas. Elas participaram de um processo de imersão por uma semana para pensarem, juntas, em como intervir positivamente na cidade. O resultado foi um projeto de financiamento coletivo no Catarse, o PASSANELA, que já está com um protótipo montado na passarela que passa em cima da avenida Rebouças, ligando o Hospital das Clínicas ao bairro do Jardins.

Estrutura montada na passarela do hospital das clínicas

A estrutura fica na passarela que passa em cima da av. Rebouças e liga o Hospital das Clínicas ao bairro dos Jardins

“O projeto quer ativar as passarelas de pedestres de São Paulo e do Brasil e transformá-las em lugares mais atraentes, que te dêem uma experiência sensorial, tátil, visual, mais legal da cidade. As passarelas são lugares tão áridos que as vezes as pessoas preferem atravessar pelo nível em uma avenida super movimentada e colocam a própria vida em risco. Então a gente quer convidar as pessoas a se movimentarem de forma mais segura na cidade, e fazerem isso tendo uma experiência agradável”, explica.

A programação do festival também contou com uma mostra de curtas e longas financiados coletivamente e oficinas sobre os temas no Centro Cultural da Juventude Ruth Cardoso (CCJ).

Foto 1, 2 e 3: Imagens cedidas pela organização do evento
Foto 3: Sophia Suh


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