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Não compre, peça emprestado

Iniciativas como o site Ciranda permitem que objetos possam circular entre as pessoas sem nenhum custo
Bruno Torres
27/09/19

A sociedade é consumista, isso é fato. A cultura do comprar está enraizada nas pessoas, que muitas vezes associam felicidade ao ter. Esse estilo de vida é pautado pelas grandes empresas e meios de comunicação que mostram o que devemos fazer para ser uma sociedade economicamente saudável é comprar, comprar e comprar. Em razão dessa lógica, produtos novos enchem as prateleiras de estabelecimentos a espera de um dono que, mesmo sem condições, compra os objetos para manter a satisfação momentânea e estar incluído no grupo dos que “têm”.

O consumismo leva as pessoas a comprarem o que não precisam. O resultado desse processo é tornar o descate e o lixo coisas corriqueiros. Quanto mais consumimos, mais descartamos, mais lixo produzimos. É comum trocar de celular, de televisão, de computador e até de carro quando um novo modelo é lançado. A facilidade de adquirir os produtos faz com que os desejos pessoais sejam alimentados cada vez mais. Porém, o deslumbre com os objetos acaba rápido e faz com eles sejam deixados de lado e até jogados no lixo.

Pensando em formas para reverter essa situação, o criador do site Ciranda decidiu atuar na conscientização e na construção de novos estilos de vida. Foi por isso que ele criou uma rede digital empréstimos na qual colaboradores se cadastram e trocam objetos quando precisam. Em entrevista exclusiva ao Portal Namu, Henry Goldsmid conta um pouco da história, como funciona e qual são os resultados da iniciativa.

Portal Namu: como surgiu a ideia de criar o site Ciranda?
Henry Goldsmid: morei seis anos nos Estados Unidos e é muito comum por lá que as pessoas se movam frequentemente entre as cidades. Não foi muito diferente comigo, pois desde 2008 morei em mais de sete cidades. Durante essas constantes mudanças, eu e minha esposa acabávamos deixando muitas coisas para trás por falta de espaço e, quando chegávamos no novo endereço, tínhamos de comprar tudo de novo, como aspirador, escada e furadeira. Aquilo me incomodava muito, porque, além do desperdício, aqueles itens eram usados raramente. Acabei conhecendo um site chamado Nighborgoods, que tinha uma proposta de empréstimo de itens entre vizinhos. Me apaixonei instantaneamente e, desde então, participo e empreendo no mundo do colaboracionismo. Quando eu e minha esposa tivemos a oportunidade de voltar para o Brasil, em 2014, resolvemos adaptar esta ideia e criamos o Ciranda. 

Como funciona a iniciativa?
Nos sites de empréstimos entre vizinhos percebemos que com o tempo as pessoas tendem a não responder os pedidos. Existe um impulso inicial, mas, infelizmente, o incentivo não permanece na rede por longo prazo. Nossas experiências e pesquisas mostram que as pessoas se cansam e que é necessária uma massa crítica muito satisfatória para manter a engrenagem rodando. Por isso, o Ciranda propõe criar um modelo em que não exista o conceito de dono, mas sim o de uma rede de copropriedade. Se todos são donos, todos cuidam, todos participam. Para que haja abundância de itens e interações entre as pessoas, é preciso ter um relacionamento diferente com as coisas e mudar o conceito de que é necessário possuir para se ter acesso. Cada usuário é convidado a transformar um pertence em um bem compartilhado e o deixa circular livremente na rede. Em troca, todos utilizam tudo que precisam.

Bikes coletivas Ciranda

Existe um mínimo de objetos para se cadastrar no site? Quais tipos de objetos são cadastrados e qual é o tempo máximo para ficar com eles?
Não existe mínimo, quanto mais abundante melhor, e também não há regras de tempo de uso. Quando sairmos desta primeira versão, todos os itens poderão ser cadastrados. É importante lembrar que em redes verdadeiramente colaborativas a única regra é a abundância: se tem para todo mundo, todos acreditam que terão acesso quando precisarem. Isso estimula a colaboração para criar ainda mais e potencializar o fluxo das coisas. Regras de separação e escassez apenas interferem na livre circulação de ideias e relacionamentos. O Ciranda propõe justamente o oposto. Neste momento, por exemplo, estamos realizando o piloto com apenas bicicletas, pois nossos estudos mostram que este é um item de grande desejo e de alta ociosidade.

Você acredita que sites desse tipo são capazes de diminuir o consumismo na sociedade?
Certamente. O consumismo é apenas uma das consequências de nossa cultura de separação e escassez. Aprendemos que temos que ter o nosso, caso contrário não teremos de forma alguma. Pior do que isso, temos que lutar contra o próximo, pois não há para todo mundo. Se acreditamos que não estamos sozinhos e que temos uma rede de suporte, diminuímos o medo e a necessidade desenfreada de competição. Imagine quantas coisas estão paradas em nossas casas, enquanto poderiam ser utilizadas por toda uma rede. Haveria necessidade mesmo de consumir tanto? É essencial lembrar que as vantagens não se restringem apenas à diminuição do consumo. Quando tiramos o cifrão da definição de todos os itens, serviços e interações, somos obrigados a entender o valor social das coisas. Assim, acredito que esse tipo de sociedade é mais feliz.

Foto 2: Ciranda


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