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O chocolate vai realmente acabar?

Pesquisadores estudam soluções para a vassoura de bruxa, praga que devastou produção nacional de cacau
Bruno Torres
27/09/19

Imagine não poder mais comer aquele bombom depois do almoço? Ou então se esbaldar numa barra de chocolate de vez em quando? As previsões dos maiores fabricantes desse produto no mundo, Mars Inc. e Barry Callebaut AG (BARN), especulam que,em 2030, o déficit mundial de chocolate será de 2 milhões de toneladas. Isso não significa que o doce tem data marcada para acabar, mas uma coisa parece certa: o preço vai subir. E muito.

As razões são várias. Entre elas: o aumento da demanda de grandes mercados, a infestação de pragas que devastam produções e as mudanças climáticas que comprometem as condições ideias para plantio do cacau.

Além de o chocolate estar mais acessível em várias regiões do mundo, há aumento da quantidade de cacau em alguns produtos. São cada vez mais comuns os chocolates, por exemplo, com 70% de cacau –considerados mais saudáveis por conterem menos açúcar. O problema é que a produção da semente parece não dar conta de tanto consumo.

Solução nacional

Para tentar amenizar as previsões catastróficas e aumentar a produção brasileira, há quinze anos um grupo de pesquisadoresdo Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB-Unicamp) vem tentando encontrar estratégias para combater a praga conhecida como "vassoura de bruxa". Ela devastou grande parte da produção nacional de cacau nos anos 1990 e originou uma crise econômica para algumas regiões do país, principalmente o sul da Bahia.

“Até 1990, o Brasil ocupava a posição de segundo maior produtor de cacau do mundo, com uma produção anual de aproximadamente 400 mil toneladas. No entanto, uma queda drástica ocorreu em razão do aparecimento da doença vassoura de bruxa do cacaueiro, principalmente, na região sul da Bahia”, relata Daniela Toledo Thomazella, pesquisadora do IB. “A praga se tornou um problema econômico tão grande para cacauicultura nacional que a produção não foi capaz de suprir a demanda da indústria chocolateira nacional e o Brasil saiu da condição de exportador para se tornar um importador”, conta Thomazella.

Com o intuito de entender essa doença,iniciou-se em 2000 o projeto que sequenciou o genoma do fungo Moniliophthora perniciosa, causador da vassoura de bruxa. “Em particular, identificou-se um gene que codifica para uma proteína (enzima) relacionada à resistência do fungo a fungicidas e também aos mecanismos de defesa da planta”, revela a pesquisadora.

Barra de chocolate com 75% de cacau
O aumento da porcentagem de cacau nos produtos foi um dos responsáveispelo alta do consumo da semente

A partir desses resultados, pesquisadores da Unicamp procuram desenvolver uma droga para inibir essa proteína. “O objetivo é obter uma molécula altamente estável que iniba especificamente a enzima do fungo, mas que não tenha nenhum impacto negativo no cacaueiro, nos seres humanos ou no ambiente”, diz Thomazella.

“Além disso, recentemente, nós analisamos os genes expressos pelo cacaueiro e pelo fungo durante a manifestação da doença vassoura de bruxa. Esse trabalho gerou um conjunto de evidências que mostram como o fungo manipula a planta hospedeira em seu favor, em especial alterando o metabolismo hormonal da planta”, conta. “Notavelmente, com essas informações em mãos, sabemos agora as vias e proteínas que são importantes para o desenvolvimento da infecção, o que nos permite criar estratégias para interferir e interromper a progressão da praga”, afirma confiante a pesquisadora.

De onde vem o cacau?

“O cacaueiro é uma planta nativa das regiões tropicais das Américas, mais especificamente da região da Bacia Amazônica. É, portanto, uma planta de climas quentes e úmidos”, explica Thomazella. “No mundo, a disseminação do cacau ocorreu como consequência da sua popularização na Europa”, diz.

De acordo com o site do Instituto Cabruca, que promove o modo conservacionista de se plantar cacau, o contato inicial dos europeus com o cacau foi em 1502, quando um dos navios da quarta expedição de Colombo às Américas encontrou na costa norte da atual Honduras uma canoa nativa contendo amêndoas de cacau para comércio.

A introdução do cacau na África ocorreu na segunda metade do século 19. Pouco tempo depois, países africanos já tinham se tornadoos maiores produtores da semente. Atualmente, a produção global se concentra na costa oeste da África, que responde por aproximadamente 70% da produção mundial de cacau. Em particular, quatro países se destacam: Costa do Marfim (maior produtor mundial), Gana, Nigéria e Camarões.

No Brasil, a produção de cacau foi levada da região Amazônica para o sul da Bahia, onde encontrou um dos melhores solos e climas para a sua expansão. Atualmente, a produção nacional ocorre majoritariamente no estado da Bahia, que produz até 90% do cacau nacional. Outras regiões produtoras estão nos estados do Espírito Santo e Pará.

Fruto do cacau
O plantio de cacau é considerado mais sustentável que o de monoculturas como a soja que devasta grandes áreas

Enquanto o Brasil enfrentou essa drástica crise na cacauicultura, os países africanos continuaram livres da devastadora doença vassoura de bruxa. Para Mark Guiltinan, biólogo molecular da Universidade Estadual da Pensilvânia e especializado em cacau, o contágio no continente africano seria apenas uma questão de tempo. Por exemplo,alguém pode, inadvertidamente, transportar frutos de cacau, sem primeiro verificar se há infecção.

Para o biólogo, um modo de evitar a praga em longo prazo seria reproduzir plantas melhores e propagá-las vendendo para os agricultores e os ensinando a usar melhores métodos, além de conceder acesso a fertilizantes e outros insumos.

Produção sustentável

O plantio de cacau é considerado como mais sustentável quando comparado com as monoculturas como a soja e o milho que devastam grandes áreas de biomas . “O crescimento de uma monocultura não é tão bom para o ambiente quanto é o crescimento de uma árvore perene igual ao cacaueiro”, afirma Guiltinan. “Uma monocultura aumenta a erosão do solo e reduz a biodiversidade da área”, explica o pesquisador.

O plantio do cacau pode ser ainda mais conservacionista quando realizado sob a sombra de árvores nativas. Quando é plantado dessa maneira, o cacau recebe o nome de cacau-cabruca. Segundo o site do Instituto Cabruca, localizado em Ilhéus (BA), o sistema de cultivo conservacionista ajuda a manter os biomas Mata Atlântica e Amazônia ajudando a preservar mais de 228 espécies nativas. Entre elas estão: pau-brasil, jequitibá, jacarandá, vinhático e cedro-rosa. Além de propiciar que animais ameaçados de extinção, como o mico-leão da cara dourada, usufruam deste cenário conservado pra se deslocar entre fragmentos florestais isolados.

Fotos: Ever Jean/ Flickr: Everjean/ CC BY 2.0; Eric Hossinger / Flickr: Eric Hossinger / CC BY 2.0


Receitas para consumir o cacau:
Brownie vivo
Néctar theobroma
Trufa da culinária viva


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