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O grafite que constrói coisas belas

Para Mariana Degani e Verônica Alves, as Pupillas, a arte de rua é um ato político capaz de humanizar o cotidiano
Bruno Torres
27/09/19

Comunicar poesia por uma linguagem autoral de ilustração foi o que motivou as artistas visuais Mariana Degani e Verônica Alves a criarem o projeto Pupillas, em 2007.Paulistanas, ambas já percorreram vários paísesespalhando suas ilustrações e se especializando.

No Brasil, é possível encontrar sua arte em paredes comerciais, residenciais e street arts em cidades como São Paulo, Curitiba, Vitória eRio de Janeiro. O trabalho das duas artistas também está presenteem locais como BuenosAires, Lyon, Toulouse, Paris, Marselha, Antuérpia eBerlim.

Inicialmente, elas se graduaram em design de moda e trabalharam com estilo e produção, até que apaixão pela poética visual as encaminhou para ailustração.

As artistas testam constantemente novas superfícies para seus traços. Ilustraramparedes, tecidos,peças decorativas e até pele.

Em entrevista exclusiva ao Portal NAMU, a dupla fala sobre suas influências, os trabalhos com grafite em residências e locais públicoe o novoprojeto,Orgasmus Multiplus, provandoque omaiorobjetivo dessaparceria é desconstruir padrões e transformá-los em beleza.

Portal NAMU: Quais são as influências de vocês e qual é a principal proposta do Pupillas?
Pupillas: Nosso trabalho é reflexo de nosso olhar e interpretação do que nos inspira. Coisas belas nos inspiram. As diferentes e múltiplas belezas de pessoas, da natureza, formas, jeitos de viver, sensações. Também somos inspiradas pelas coisas que não são nem um pouco belas, como os tabus, o desejo por padronizar pessoas e comportamentos, a aridez de espaços e sentimentos. Essas coisas nos inspiram no sentido de propor questionamentos, criar novas óticas sobre cada coisa. O exercício pessoalde desconstruir achismos e construir novas formas. E aí voltamos para beleza. Nosso trabalho, mesmo quando manifesto, é tecido de elementos que capazes de produzirprazer aos olhos do observador.

Pupillas
As artistas desenvolvem trabalhos de ilustração em muros, paredes, tecidos epeças decorativas

Vocês costumam grafitar muros e outros espaços públicos. Na opinião de vocês, o que essas ilustrações podem trazer para as pessoas que passam por esses espaços?Qual é o papel do grafite no meio urbano? Há um papel político ou é apenas estética?
Grafitar espaços públicos significa colocar a sua arte à disposição de qualquer transeunte. Não é preciso ir à galeria, ao museu, ou a espaços que muitas vezes intimidam e são desconhecidos por muita gente. Ocupar com cores espaços que muitas vezes são ocupados pelo cinza normativo já é em si um ato político. Traz questionamentos e reflexões ao cotidiano de pessoas que nem sempre estão procurando por isso.

O grafite que vocês produzem também pode ser uma opção para decoração de residências? Como é a procura desse trabalho? Há muitaspessoas encomendandografites para aprópria casa?
Sim! Na verdade, o caminho que fizemos para chegar no grafite veio da ilustração. Foi procurando novas superfícies e tamanhos que chegamos nas paredes. E as paredes residenciais vieram antes que as das ruas. O papel não deu mais conta. Pintamos a mesa. Quando a mesa não foi suficiente, os desenhos começaram a subir pelas paredes. E então eles foram para rua. Para omundo. Temos muitas pinturas residenciais. Os pedidos e os tipos de clientes são os mais variados. E sempre criamos um projeto específico, ou seja, criado para determinado lugar, de acordo com o seu entorno, com as suas características. Desta forma, funciona muito bem para residências. No nosso caso, ao invés de trazer uma parede da ruapara casa da pessoa, criamos uma para ela noseu espaço uma parede que poderia estar na rua, em qualquer lugar, mas que ali faz muito sentido.


As ilustraçõessão também muitopedidas comodecoraçãoem diferentescômodos residenciais

É frequente que essas pessoas cansem dos desenhos? O que pode ser feito quando isso acontece?
Há oito anos fazemos projetos desse tipo. Nunca soubemos de algum cliente que tenha se cansado, mas talvez ele apenas não nos informou. Quando desenvolvemos o projeto, o cliente é uma grande fonte de referências, alinhado à nossa linguagem. Por receber uma pintura que vai muito de encontro com seus desejos, talvez isso demore mais a acontecer. De qualquer maneira, pode ser que esse dia chegue. E aí, umas boas demãos de tinta branca resolvem o problema. E depois, é só chamar a gente de novo, nos atualizar sobre seus quereres que rapidamente surge uma novíssima parede pupillística.

Recentemente, vocês lançaram o projeto Orgasmus Multiplus. Também em outros trabalhos vocês expressam a naturalização do prazer feminino. Por que vocês escolheram esse tema? Qual a importância de retratá-lonuma sociedade ainda muito machista como a nossa?
O projeto Orgasmus Múltiplussurgiu da série de pinturas "orgásmicas"nas quaisilustramos corpos femininos nus em meio a natureza. Esses corpos também são natureza bruta. Selvagem. O corpo feminino é repleto de simbologias. E é podado, oprimido, censurado. Há centenas de anos e até hoje. Essas simbologias, em grande parte, são relacionadas a uma sexualidade que quasenunca diz respeito à natureza e ao prazer feminino. A mulher nua e seu prazer estão quasesempre a disposição do prazer alheio, como um troféu quando dentro dos padrões, e com escárnio quando estão fora.

O prazer sexual e o corpo feminino, ainda em 2015, são usados para desqualificar as mulheres. Nosso trabalho propõe uma nudez bruta e natural, que ganha simbologia sexual no momento em que esta mulher decide que quer usar seu corpo para isso. E nada melhor do que ser íntima do próprio corpo. Visto o tamanho interesse de diferentes mulheres por essa série, começamos a pensar de que forma poderíamos dialogar mais com elas. De que forma elas poderiam colaborar com nossa pesquisa e também fazer parte do projeto. Foi entãoque pensamos em coletar relatos sobre orgasmo, que nos servissem de inspiração para as pinturas. Os relatos são livres e anônimos. O mais incrível do processo de construção deste projeto é perceber o quão pouco as mulheres se propõem a pensar,falar,escrever sobre issoe como isso foi estopim para muitas delas começarem a pensar.


Veja também:
Grafite valoriza a mulher brasileira
Os olhos que veem a arte das ruas
Amelinha Teles: militância e luta pelos direitos da mulher


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