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Cidades

Saiba por que falta água em São Paulo

Colapso do Sistema Cantareira prejudica o abastecimento na cidade e pode paralisar atividades econômicas
Bruno Torres
27/09/19

No site Faltou Água, o mapa da cidade de São Paulo está tomado por manchas alaranjadas. Os círculos coloridos correspondem às denúncias de interrupção do abastecimento de água. Os relatos foram feitos por moradores de diversos bairros da maior metrópole do país.

Os comentários mais recentes na página revelam que o racionamento está presente nas quatro regiões da cidade. Danilo Miranda relata: “Corte de água da meia-noite às 6h30min no Jardim São Paulo (zona norte). Acontece há pelo menos uma vez na semana”. A reclamação é semelhante à de Luciana Jambo, Betina Schimidt e Carolina Alves, moradoras, respectivamente, do Jardim Bonfliglioli (zona norte), Interlagos (zona sul) e Pirituba (zona leste).

O governador Geraldo Alckmin (PSDB) titubeia ao afirmar que o racionamento é uma realidade. Para ele, o que existe é uma restrição de recursos hídricos determinada pela Agência Nacional de Águas (ANA). Com base na ordem da agência, o volume captado no Sistema Cantareira diminuiu de 30 mm³/s para 16 mm³/s. Nos próximos meses, com o agravamento da crise, a redução chegará a 13 mm³/s.

Ao citar a determinação da ANA, Alckmin nega a necessidade do racionamento como uma medida oficial, adotada em razão da gravidade da situação. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo em agosto de 2014, o governador declarou de forma incisiva: “Não tem nenhuma expectativa de haver racionamento. É um erro do ponto de vista técnico”.

Da mesma forma que o tucano, a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) nega que exista rodízio de recursos hídricos, porém flerta com a possibilidade. Em artigo publicado na Folha de S.Paulo, em 22 de janeiro desse ano, Jerson Kelman, atual presidente da companhia, afirma: “O termo ‘racionamento’ é usado, em geral, quando se força a diminuição coletiva de consumo por meio da total interrupção do fornecimento por algumas horas do dia ou quando se impõem cotas individuais de consumo. Não é o que a Sabesp tem feito, mas poderá ser forçada a fazê-lo, se continuar a não chover nos lugares certos e nas quantidades necessárias”.

No mesmo artigo, Kelman assume que algumas regiões da cidade estão sendo submetidas à diminuição de pressão na rede de distribuição de água. Apesar dos transtornos causados à população, o presidente da companhia afirmou que a redução é necessária para atenuar o vazamento das tubulações subterrâneas. “Trata-se de uma medida preventiva para evitar um mal maior, que seria a exaustão da pouca água ainda armazenada nos grandes reservatórios”, justificou.

Antes de Jerson Kelman vir a público, a Sabesp já havia divulgado em seu site um documento de 17 páginas com a lista dos bairros da Grande São Paulo afetados pela redução de pressão nas tubulações. Os conhecidos bairros do Bom Retiro, Consolação, Jardim Paulista, Morumbi, Pinheiros, Vila Mariana, Mooca, Grajaú e Itaquera integram o levantamento (veja aqui a lista completa).

Faixas de bônus e multas

Apesar do repúdio ao racionamento, a Sabesp e o Governo do Estado de São Paulo têm estimulado a redução do consumo de água por meio de campanhas educativas e faixas de bônus. Em curto prazo, essas últimas são mais eficazes do que as campanhas por promoverem de forma imediata a diminuição dos recursos hídricos gastos pela população.

Há três categorias de faixa de bônus. A primeira determina que o imóvel com redução igual ou maior a 10% no consumo terá desconto de 10% no valor de sua conta. A segunda contempla consumidores que reduzirem o gasto em 15% ou mais. Estes terão desconto de 20%. A terceira abarca domicílios que conseguirem economizar 20% ou mais e determina desconto de 30%. O cálculo que dá direito à bonificação é realizado com base na média do consumo de 12 meses (entre fevereiro de 2013 a janeiro de 2014).

Atenta também à parcela da população que, por motivos variados, tem dificuldade em aderir à campanha de contenção, a Sabesp criou multas. Os consumidores que aumentarem o gasto de água em 20% terão um acréscimo na mesma proporção em suas contas. Se a utilização for maior que de 30%, o valor da conta será 50% maior.

Além das ações que mexem no bolso do contribuinte, normalmente impopulares e mais cômodas de serem aplicadas, existem outras formas de economizar. Uma delas é a captação doméstica da água das chuvas para a realização de tarefas, como limpeza de pisos, lavagens de carros, calçadas e irrigação de plantas.

Reduzir a vazão do chuveiro, além do tempo de banho, e substituir as antigas válvulas de descarga pelas de caixa acoplada são ações que podem ajudar. O banheiro, grande vilão do desperdício de água, é responsável por 60% do gasto em residências, conforme dados da Sabesp.

O que pode acontecer?

Com a diminuição das chuvas e aumento das temperaturas, São Paulo terá de encontrar um caminho para não depender do Sistema Cantareira. O governador Geraldo Alckmin já anunciou o início das obras de um novo sistema de abastecimento, o Sistema São Lourenço. O empreendimento, que aumentará a capacidade de produção e fornecimento de água tratada para a Grande São Paulo em apenas 7%, tem previsão de entrega para 2017, ou seja, é uma solução tardia para um problema antigo.

O governador também afirmou que irá retirar mais água da reserva de Billings, um dos braços do Sistema Rio Grande que abastece 1,2 milhões de pessoas na região do ABCD paulista. A ideia é auxiliar o Sistema Guarapiranga na tarefa de fornecer água para moradores antes atendidos pelo Cantareira. Na caso da Billings, o maior problema é ao altíssimo nível de poluição da represa. Grande parte do esgoto das residências e empresas que ocupam paradoxalmente a região não é tratado, o que pode inviabilizar a transposição.

Em curto prazo, a situação é delicada e incerta. Segundo Pedro Luiz Cortês, professor da USP e do Programa de Mestrado em Gestão Ambiental da Universidade Nove de Julho (UniNove), “o cenário tende a se agravar, pois se a redução dos níveis do Sistema Cantareira e Alto Tietê continuar até a metade do ano, deixaremos de ter água para captação nesses dois conjuntos de reservatórios. Com isso, não contaremos com mais de 50% da água que utilizávamos antes da crise”.

Os impactos da falta de água serão variados. “O abastecimento irá repercutir nas residências, mas também haverá impacto pesado no comércio e pequenas indústrias que dependem da água distribuída pela Sabesp. Poderá haver desemprego e prejuízo à atividade econômica, com reflexos no PIB regional”, afirma Cortês.

Em relação às grandes indústrias, o professor explica: “elas utilizam poços tubulares profundos (os chamados “poços artesianos”) ou fazem a captação direta em cursos de água”.

Cortês esclarece que no primeiro caso, não haverá prejuízo imediato à atividade industrial, a menos que ocorra uma superexploração da água subterrânea em algumas regiões.

No caso da captação direta, a situação é diferente. “Como há a redução de volumes de água em diversos rios, isso poderá prejudicar de fato a atividade industrial e fazer com que algumas indústrias reduzam suas atividades ou busquem regiões com maior disponibilidade hídrica”, acrescenta.


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