O Brasil é o quarto maior produtor de alimentos do mundo, de acordo com relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Dessa produção, 25,7% excedem o que é necessário para alimentar a população brasileira. Foram essas estatísticas que mobilizaram jovens chefs ligados ao movimento Slow Food Brasil a realizar a Disco Xepa.
Os números do desperdício de comida no Brasil são impressionantes. Diariamente, 39 mil toneladas são jogadas no lixo, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). O contraste com o número de brasileiros que passam fome, 13,6 milhões, é uma questão grave a ser resolvida.
Foram essas estatísticas que mobilizaram jovens chefs ligados ao movimento Slow Food Brasil a realizar a Disco Xepa. Trata-se, na realidade, de um banquete preparado somente com os restos que iriam para o lixo depois da feira.
"A ideia é que o evento tenha uma continuidade. Vamos fechar uma carta de compromisso para ser discutida dentro do conselho municipal de segurança alimentar para que o tema seja tratado politicamente. Além disso, queremos fazer um trabalho com os feirantes para que eles incentivem os consumidores a selecionar os alimentos que seriam descartados para o consumo", conta a chef da eco-gastronomia Daniela Lisboa.
Pesquisas da FAO apontam que, a cada ano, os alimentos produzidos e não consumidos utilizam um volume de água equivalente ao fluxo anual do rio Volga na Rússia. Também que são responsáveis pela emissão de 3,3 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa na atmosfera do planeta.
A pesquisa apresenta ainda as consequências econômicas diretas do desperdício de alimentos (sem incluir peixes e frutos do mar). Cerca de US$ 750 bilhões por ano são desperdiçados como resultado do não aproveitamento dos produtos alimentícios.
Mais alarmante ainda é saber que cerca de 64% do que se planta no Brasil são perdidos ao longo da cadeia produtiva, segundo pesquisa do Instituto Akatu (3). Desse total, 20% na colheita, enquanto 8% no transporte e armazenamento. São perdidos também 15% na indústria de processamento, 1% no varejo e 20% no processamento culinário e hábitos alimentares.
“O importante nessa luta contra o desperdício é informar. Porque eu acredito que as pessoas deixam de aproveitar todo o alimento porque falta informação, por isso nossa missão é levar o conhecimento”, aponta Daniela Lisboa.
Em sua cozinha, ela prepara somente pratos nutritivos e não industrializados. “Penso no impacto ambiental que o alimento produzido traz, desde a quantidade de água usada para higienização, até o uso integral dos alimentos com seus talos e ramas”, finaliza.
Lisboa foi uma das coordenadoras da Disco Xepa, movimento ligado ao Food Revolution Day (3). O movimento busca transformar a forma como a alimentação é vista na sociedade, mapeando o ciclo completo do alimento, da plantação até ele chegar à mesa.
O preparo de pratos saborosos e criativos durante o evento atraiu as pessoas que passavam pelo local. Orgânicos, veganos e cheios de nutrientes, os quitutes da Disco Xepa agradaram os presentes.
O evento de encerramento da Disco Xepa foi realizado no Beco do Aprendiz, na Vila Madalena, em São Paulo. Chefs, coletivos que trabalham com alimentação orgânica e sustentável, bandas e palestras sobre aproveitamento de alimentos recepcionaram o público que passou pelo local.
A iniciativa começou dias antes, com debates sobre filmes, no período da noite, para abordar as polêmicas relacionadas à alimentação nos dias de hoje.
O público que participou do evento teve a possibilidade de degustar pratos preparados com a xepa de diversas feiras orgânicas da cidade. A montagem do cardápio foi coordenada pelos chefs presentes e elaborada em conjunto com uma equipe de voluntários.
Se não cuidarmos do meio ambiente, não vai ter comida. Temos de mostrar que a alimentação sem carne traz prazer e é muito saborosa.
Martha Tatini, eco-chef de Slow Food, ministrou uma oficina sobre como preparar uma moqueca vegana e coordenou a produção dos pratos servidos no banquete. Tatini é vegetariana desde pequena e, por meio do convívio com tribos do Xingu e de experiências na África e na Índia, se especializou em "gastronomia sensitiva".
"Eu aprendi, por meio da observação, a utilizar os talos e as cascas na hora de cozinhar", conta a especialista na cozinha orgânica. "Eu via as pessoas jogando fora as melhores partes e fui aprendendo a preparar jantares inteiros só com sobras que iriam para o lixo". A chef diz que as pessoas pagam pelos produtos e não levam talos e cascas por falta de conhecimento.
Sobre a culinária sem carne ou derivados de animais, ela afirma: "não adianta dizer que a pessoa optou ser vegano apenas pelos animais. E se destruirmos o ambiente?", questiona.
Adriana Vernacci, chef de cozinha.
“Acredito que as pessoas devem ficar atentas ao que colocam na mesa", afirma a chef Adriana Vernacci.
Na Disco Xepa, sua oficina ensinou crianças sobre a importância dos alimentos nutritivos. "Temos de deixar de consumir os industrializados e, principalmente, oferecer às crianças produtos naturais. Elas só sabem o que é salgadinho e não conhecem, infelizmente, o que vem da terra", comenta a chef.
Vernacci desenvolve o projeto Chef na Feira, que leva nomes da gastronomia saudável para palestrar sobre receitas e formas de aproveitamento dos alimentos em feiras orgânicas de São Paulo.
Carol Sá, do Slow Food Rio de Janeiro, acredita que eventos como a Disco Xepa podem chamar atenção das pessoas para o desperdício alimentar de forma alegre e divertida.
“O Slow Food é um movimento muito abrangente que trata de questões alimentares muito profundas, eventos como esse são importantes para aproximar e chamar a atenção dos jovens para a temática do alimento".
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